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milhões de anos, o corpo humano vem se transformando e evoluindo para se adaptar ao ambiente e assim poder se desenvolver. Portanto, torna-se fundamental que tenhamos com ele uma relação harmoniosa. E, segundo o codificador do espiritismo, o francês, Allan Kardec, “O corpo existe tão somente para que o espírito se manifeste” . Partindo dessa premissa, muitos acreditam que a saúde do homem está condicionada aos seus pensamentos. Talvez por isso haja uma propagação dos livros de autoajuda, onde o pensamento positivo é incentivado como forma de se manter o vigor corpóreo, o que confirma a famosa citação latina, derivada da Sátira X do poeta romano Juvenal, “Mens sana in corpore sano”. No entanto, chegamos às portas do terceiro milênio, num mundo dominado pela cultura exagerada a corpos, ora esqueléticos ora “malhados” demais, e onde ninguém parece estar muito preocupado com a saúde mental. Conforme o escritor francês François La Rochefoucauld “Temos mais preguiça no espírito do que no corpo”. Contudo, essa inversão de valores têm levado muitos indivíduos a extrapolarem a racionalidade, através de regimes mirabolantes, de cirurgias plásticas, do consumo de esteróides e anabolizantes... A questão toda está, mais uma vez, em volta da padronização definida pela ditadura social. O assustador nisso tudo é que pesquisas recentes apontam que a maioria das pessoas está insatisfeita com o seu corpo, e que se submeteria a plásticas corretivas. Segundo o antropólogo francês, David Le Breton, em seu livro “Adeus ao Corpo”, o ser humano está, plasticamente, se “moldando” conforme sua vontade, porém "Ninguém deve culpar-se pelo que sente, não somos responsáveis pelo que nosso corpo deseja, mas sim, pelo que fizemos com ele", disse, certa vez, o escritor gaúcho Érico Veríssimo.


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O professor japonês Hirochi Ishiguro e o seu alter ego Geminoid HI-1 |
CYBORG – A discussão é antiga, o homem sendo substituído pela máquina... A inspiração partiu das telas de cinema, que entendeu o temor humano de ser trocado por robôs e andróides. A conspiração se fazia sentido ou não já é outra história. Atualmente, influenciado pela indústria da moda e pela mídia, o ser humano se mutila para se tornar cibernético: frio e imortal, alguém sem expressão, talvez um cyborg, já que virou pecado mortal ter um corpo envelhecido e flácido: com rugas, celulites, estrias e sem implantes de silicone ou botox. “... a mídia impôs padrões de beleza que atendem somente aos interesses comerciais”, declarou recentemente, em entrevista à ISTOÉ independente, o célebre cirurgião plástico, Ivo Pitanguy. O incentivo cruel vem, também, das passarelas, onde modelos andróginos desfilam roupas como se fossem “cabides ambulantes” - o irônico é pensar que a moda é feita para todos. “O mundo não precisa de pessoas obcecadas pela estética do corpo, precisa mesmo é de pessoas melhores”, observou o estilista brasileiro Jum Nakao. Contudo, ao sentirem-se traídas pela sua constituição física, muitas pessoas são levadas a atentar contra o próprio corpo, quando cometem contra ele verdadeiras atrocidades. Essa morfofobia ao contrário de corrigir, acentua ainda mais os defeitos e desfigura completamente a imagem humana.
Em suma, cada vez mais plastificado o corpo humano vai deixando de ser carne para tornar-se sintético. Não haverá demora até que a única coisa “real” no homem seja sua mente, que se tornará cativa de um corpo cibernético. Então, aprisionado por este modelo “artificial” de beleza, a imortalidade e o vazio, finalmente estarão inseridos na vulgaridade que se tornará a vida humana. O aspecto positivo está no fato de que não haverá lágrimas para o arrependimento... Mas como já disse o poeta alemão Friedrich Novalis, “Só há um templo no mundo e é o corpo humano. Nada é mais sagrado que esta forma sublime. Inclinar-se diante de um homem é fazer homenagem a esta revelação na carne. Toca-se o céu quando se toca um corpo humano.”