quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Livre-arbítrio é sua responsabilidade individual

Adepta do livre-arbítrio acredito que, enquanto adultos, somos responsáveis por nossas escolhas e que ninguém deveria interferir nesse processo particular que conduz ao autoconhecimento, quando obviamente não fere o decoro nem a moral humana. "E quanto maior o conhecimento, maior o livre-arbítrio" Carlos Bernardo González Pecotche. Entretanto, cada vez mais, percebo com desgosto e irritação essa mania que muitas pessoas têm de tentar impor seus códigos de conduta ao outro, como se isso fosse a supremacia da verdade absoluta. Faço essa afirmação porque recentemente minha filha adotou o vegetarianismo como filosofia de vida, quando constatou que essa dieta tem um impacto positivo sobre o meio ambiente e, por sua vez, há também a questão dos animais em si, uma postura ética de não aprovar essa clara posição de predador a qual nos encontramos na cadeia alimentar. E ao observar como a indústria da carne trata os animais para o abate na intenção de servir ao consumo humano, percebe-se claramente que algo está muito errado e que para nossa satisfação pessoal à mesa são imputados a essas pobres criaturas um verdadeiro inferno na terra, e isso o próprio leitor pode comprovar numa busca rápida pela internet. As informações estão ao alcance de todos, só não tem conhecimento quem não se interessa pelo assunto.
      Já os vegetarianos e os veganos sentem essa empatia maior em relação aos animais do que o restante da população, e não querem se envolver com tanta crueldade. E quem pode afirmar que isso é um problema? Como pode isso provocar tantos comentários maldosos? É como se as pessoas, num acesso de culpa e vergonha, tentassem impedir o outro de alcançar essa grandeza espiritual, porque eu sinceramente admiro essa postura, quando o objetivo é obviamente em prol de algo que traga benefícios ao meio ambiente e aos próprios animais. Diante dessa questão compreendi que existem outras formas de alimentação e que a minha filha, perante aquilo que acredita, optou por algo que a deixa em paz com a sua consciência. E na verdade é isso o que importa: a paz de espírito. E é aqui que esse texto começa. Sua decisão, assim como a de muitas outras pessoas, sempre gera críticas e desconfianças. Eis a pergunta que não quer calar: por que a escolha de uns é tão massacrada por outros? Essa intenção de querer moldar o outro de acordo com a sua própria maneira e conveniência é a coisa mais arbitrária e ridícula que existe. É como tentar impedir que uma lagarta passe pelo processo natural de metamorfose. Eu defendo a teoria de que o mundo está em transformação permanente, e que isso é a única coisa que faz sentido num dia após o outro. É essa mudança que nos permitirá alcançar uma evolução física e espiritual. Porém, devido a essas pessoas que atravancam o desenvolvimento mental dos demais - essa ação natural evolutiva -, ainda caminhamos nas trevas sorvendo águas de fontes desprovidas de oxigênio. A fomentação dessa ignorância não permite que muitos consigam romper essa dependência irritante das normas arcaicas ditadas durante séculos, contribuindo para o fato de que ser aceito é mais importante do que ter opinião própria. E assim, por medo de destoar da manada, velhos conceitos fazem com que o consumo de água parada se torne algo natural. "O homem não pode pretender alcançar certas verdades, enquanto conserva dentro de si certas mentiras." Carlos Bernardo González Pecotche. 
        Porém, sob o fio tênue da linha dessa premissa percebe-se que o vegetarianismo não é uma moda, mas a construção paulatina de uma identidade social e ambiental, que tem como meta estabelecer novos hábitos alimentares e fomentar o movimento abolicionista que visa libertar os animais dessa servidão ao ser humano. Pessoas que silenciosamente estão fazendo sua própria revolução por se negarem a compactuar com esse sistema de exploração animal. E talvez seja exatamente isso que venha provocando tantos protestos, gracejos, irritações e até mesmo temores por parte dos ditos carnívoros. Já que muitos não sabem lidar com essa nova “ordem” que surge diariamente, sem muito alarde, mas que se alastra despretensiosamente como rastilho de pólvora. Assim observo com preocupação que ao adotar essa filosofia de vida, os vegetarianos passam a ser menosprezados passando à condição de personae non gratae” entre aqueles que insistem em propagar uma falsa saúde atribuída ao consumo de carne.  Mas esse movimento pela compaixão animal não deveria ser motivo para causar incômodo a ninguém, já que é exclusivamente particular, e cabe a cada um aderir ou não, de acordo sua própria filosofia de vida. Eis aqui o livre-arbítrio. Mas quando se trata de abordar esse assunto, as pessoas rapidamente se colocam na defensiva, por serem consumidoras de carne, experimentando uma fraqueza sem igual, que é imaginada como isolamento social e/ou moral. Mas o intuito desse texto não é sentenciar ou qualificar alguém por suas escolhas. Também não estou afirmando que o fato de ser vegetariano torne uma pessoa com envergadura moral superior às demais. Nem tampouco acredito que um carnívoro vá arder no inferno, tendo ele boa índole, sendo alguém socialmente ativo e participativo dentro dos princípios humanos. 
     A intenção desse texto, quero aqui registrar, é chamar à reflexão, quando aceitar o outro por suas escolhas torna-se tão difícil. E aqui eu abordei o vegetarianismo, mas poderia ser outro tema qualquer, homossexualidade, religião... Sem esse livre-arbítrio o homem atrofia e morre, ainda que esteja vivo. Ao longo dos tempos diversos pensadores e filósofos dissertaram sobre a importância da liberdade, como Sartre, Descartes, Kant, Marx e outros. Certamente eles compreendiam que precisamos dessa espontaneidade e autonomia para conduzir nossas vidas de forma plena, só assim a vida faz sentido, quando nos proporciona de modo singular e natural a fazer nossas escolhas. Por esse motivo “Não tenha medo de pensar diferente dos outros, tenha medo de pensar igual e descobrir que todos estão errados!”, Eça de Queiroz.



      

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