terça-feira, 27 de setembro de 2011

Vizinhos à cerca


O
 texto em pauta tem a modesta intenção de tentar entender o motivo pelo qual, cada vez mais, os vizinhos estão se desentendendo, isto porque a briga entre eles, segundo a Polícia Militar, representa 80% dos chamados nos finais de semana. A essa ocorrência a PM costuma chamar de desinteligência, o que faz sentido, já que um pouco de tolerância seria o suficiente para a solução da maioria dos problemas.  O fato faz lembrar a bela crônica, escrita pelo magistral Rubem Braga, “Recado ao 903”, que aborda de forma brilhante essa difícil, porém necessária, relação humana. O caso narrado pelo escritor nos leva a refletir sobre este ambiente social codificado por regras e que, por nossa própria escolha, nos isola, cada vez mais, dentro de muros gradeados e paredes de tijolos e argamassa. O "concreto", neste caso, tem por objetivo transformar as relações sociais em  virtuais.

 Ainda, segundo definição do dicionário, vizinho é aquele que está perto, próximo, é o nosso semelhante... Será? É certo afirmar que precisamos encontrar, em nosso cotidiano, um jeito de convivermos em paz com aqueles com os quais somos “forçados” a dividir cercas e/ou muros e paredes limítrofes. Este é o verdadeiro conceito de viver em  comunidade. Há sempre alguém à direita ou à esquerda, acima ou abaixo, indicando que não estamos sozinhos, e que a civilidade precisa ser praticada de forma pluralista e sem preconceito. Para isso é recomendável que cada um, a sua maneira, faça valer o seguinte lema: Viva e deixe viver, cujo intento é a demonstração de respeito à liberdade do outro; ou seja, à convivência social é imprescindível à prática da tolerância e da solidariedade. No entanto, é bom seguir o conselho de um antigo provérbio popular "Ama teu vizinho, mas não derrubes a tua cerca." Essa sensata recomendação nada mais é do que um aviso sutil: não abuse, mantenha certa distância”, já que algumas pessoas, por ignorância,  costumam ser invasivas e não conseguem perceber que o uso do espaço comum a todos os moradores, seja no condomínio, na rua, no quiosque, na piscina, no playground..., deve obedecer a determinados critérios e códigos de conduta, cujo intuito é garantir que as “fronteiras” da boa vizinhança não sejam ultrapassadas, assim é possível evitar eventuais rupturas ou desentendimentos. Portanto, reveja sua atitude, antes de adentrar à casa do seu vizinho sem aviso prévio ou sem ser convidado, pois esta é uma maneira grosseira de impor a sua presença.
Outro aspecto relevante para um bom convívio social é a importância de se manter um olhar disciplinado em direção a propriedade do outro. Logo, torna-se crucial à política da boa vizinhança que a inveja e a curiosidade sejam “trabalhadas” intrinsecamente como medida preventiva à amizade de porta/portão.
Diante desses seres – os vizinhos -, tão singularmente diferentes entre si, há uma efetiva e constante necessidade de adaptação e de entrosamento. Aquele que entende esse processo social não costuma se exceder nos ruídos seja através do seu animal de estimação ou no seu próprio convívio familiar. O bom vizinho não obriga o outro a ouvir o seu repertório musical, já que tem consciência de que gosto não se discute, assim ele escuta de forma educada o seu pagode, samba, forró, bossa nova, milonga, gospel, rock and roll, bolero, música sertaneja ou popular brasileira..., além de outras, num volume tolerável. Essa racionalização é o que possibilita uma convivência harmoniosa junto à comunidade a qual se está inserido, e demonstra que o sujeito compreende o que diz a sábia frase o direito de um termina quando começa o direito do outro”. Entretanto, sem essa compreensão, algumas pessoas são levadas a cultivar certo rancor em relação aos seus vizinhos, assim como o famoso escritor e colunista norte-americano, Ambrose Gwinett Bierce, que proferiu a seguinte frase "Vizinho: indivíduo que, segundo os mandamentos, devemos amar como a nós próprios, embora ele faça tudo o que sabe para nos levar à desobediência”. Contudo, não devemos desenvolver ou alimentar relações de amizades profundas com aqueles que, segundo alarde nossa intuição, possuem hábitos que vão de encontro aos nossos instintos básicos. Esse procedimento não nos torna arrogantes, porém sensatos e precavidos. No entanto, é importante salientar que por mais que sejamos parecidos com os nossos vizinhos e eles conosco, seremos, em algum momento, “elementos estranhos” à sua natureza: costumes, opiniões e crenças. Deste modo torna-se imperativo o desvio de assuntos controversos ou mesmo sobre a vida alheia dos outros vizinhos; atitude esta prudente e indispensável à socialização comunitária. Não que com isso não se possa encontrar nos vizinhos verdadeiros amigos, porém é bom lembrar que “cautela e canja de galinha, como diziam nossas avós, não fazem mal a ninguém... exceto à galinha”, e uma amizade verdadeira vem com o tempo e traz confiança. De acordo com esta perspectiva é possível afirmar que não se deve criar grandes expectativas em relação aos vizinhos. Mas que eles podem nos surpreender de forma positiva isto é um fato, desde que você também se disponha a ser um bom vizinho.
Em resumo, a garantia de uma boa relação entre vizinhos pode ser sintetizada numa única e mágica palavra: educação, cuja abordagem específica, neste caso, está na cordialidade e na formalidade, que jamais devem ser esquecidas, por mais que  estes sejam nossos amigos. No entanto, ter um bom vizinho é como ter conseguido o prêmio máximo de um bilhete sorteado pela loteria. Embora o seu valor seja inestimável!

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