É
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estranho abordar esse assunto em pleno século
XXI, mas a verdade é que a sociedade ainda não aceita a escolha de uma mulher
pela “liberdade”, após o divórcio ou separação. É como se ela tivesse ligado o
pisca alerta e passasse a avisar as outras, depois de se livrar das correntes,
de que uma vida fora do casamento infeliz é possível e aconselhável. Em
contrapartida, as casadas são consideradas “plenas”, pois estão sob a tutela do
macho que tudo pode e decide. Seguindo essa premissa muitos conhecidos e até
mesmo certos amigos passam a “empurrar”, de forma sutil, às vezes nem tanto,
algum pretenso candidato, com a óbvia intenção de arrumar a desordem que eles
imaginam ser a vida de uma pessoa solteira, ainda mais quando essa já passou
pela experiência do casamento ou de algum relacionamento mais duradouro. Para
eles eu cito a frase de Friedrich
Nietzsche “Minha solidão não tem nada a ver
com a presença ou ausência de pessoas… Detesto quem me rouba a solidão, sem em
troca me oferecer verdadeiramente companhia….”. A atitude, ainda que em alguns não
seja intencional, revela um comportamento machista, onde o macho deve ser o foco
principal de toda fêmea humana. O problema dessa maneira de pensar do
casamenteiro de plantão está na falta de consciência e na incompreensão
de que estar sozinho não significa necessariamente estar solitário. Contudo, o
posicionamento expõe um preconceito camuflado contra as separadas, divorciadas
e as chamadas “solteironas”, todas passam a sofrer o estigma das encalhadas.
Uma mulher sozinha representa, ainda hoje, a independência do sexo masculino e
a comprovação de sua própria competência. Não estou dizendo com isso que uma
nova (ou novas) tentativa não seja válida, porém nem sempre isso torna-se o
objetivo principal na vida de uma mulher “descasada”, e isso sim é o que deve
ser respeitado.
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Liberdade de escolha |
“Enquanto não
atravessarmos
a dor de nossa própria solidão,
continuaremos a nos buscar em outras metades.
Para viver a dois, antes, é necessário ser um”.
a dor de nossa própria solidão,
continuaremos a nos buscar em outras metades.
Para viver a dois, antes, é necessário ser um”.
Fernando Pessoa

No entanto, essa nova mulher provoca uma
inquietante e alienada sensação naquelas que temem passar pela mesma situação, isto
é, a metamorfose, nesse caso, é sempre um processo doloroso, e encarar a vida
de frente e sozinha provoca calafrios em qualquer pessoa, por isso muitas optam
por manter as aparências, levando o casamento de fachada até o fim dos seus
dias. Além disso, um relacionamento estável dá ao casal a condição única de identidade
dentro da sociedade patriarcal em que vivemos, e como eu já disse antes, a
separação costuma derrubar todas as crenças e romper conceitos
pré-estabelecidos, separando de ambos uma convivência mais amiúde com a família
do outro. Em suma nada mais será como antes, e assim deve ser, até porque a possibilidade
de inserção de outras pessoas é dada como certa, principalmente na vida dos homens, que conforme indicações de estudiosos costumam refazer suas vidas mais
rapidamente. Mas, voltando ao tema que me levou a escrever esta postagem, a
mulher sozinha volta à tona revigorada, mais confiante em sua capacidade de
recomeço, e não necessariamente trás escrito à testa “mulher solteira procura”...
Diante desse argumento fica fácil entender que ela busca pelo autoconhecimento.
Evidentemente não sou contra, nem mesmo julgo aquelas que saem à procura de
novos “amores”. Entretanto não se pode ignorar que a maioria após a dissolução
conjugal opta por qualidade, já que muito provavelmente o relacionamento anterior
não contava com esse predicado. A pergunta que não quer calar é a seguinte: por
que as pessoas acreditam que uma mulher sozinha pode estar infeliz? A
felicidade é somente um estado de espírito. Na minha particular maneira de
perceber a vida, observo um medo irracional da solidão, quando muitas pessoas
estão mais solitárias acompanhadas do que se estivessem efetivamente solteiras.
Aliás, a disponibilidade para novos relacionamentos não parece ser condição
básica para impedir certos parceiros de manter relacionamentos paralelos, haja
vista o número cada vez maior e crescente de traições. E isto sim é uma atitude
covarde de alguém que não consegue enfrentar a falida união, seja pela
religião, pelo patrimônio, pelos filhos e muito provavelmente pelo próprio
comodismo. Embora estejamos sujeitos a nos apaixonar por alguém comprometido,
até porque o amor não escolhe hora nem lugar - basta que uma centelha seja
despertada pela convivência, pelo ardor da admiração, pelo desejo e pela própria amizade - o que deve permanecer em relação ao outro é a honestidade. Do
que adianta vivermos ao lado de outro em sacrifício pelos filhos, pela
sociedade... quando o coração pulsa na presença de outro. A questão é que o
amor se não for regado constantemente murcha e faz padecer todos os envolvidos.
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Que as minhas pegadas encontrem seu destino |
Diante desses argumentos a lição que fica
é de que não devemos colocar nossa felicidade nas mãos de uma única pessoa,
somos nós os grandes responsáveis pelo deleite de saber aproveitar os melhores
momentos da vida, seja na companhia de alguém ou não, por isso finalizo esse
texto com a brilhante escritora: Clarice
Lispector
“Que minha solidão me sirva de companhia.
que eu tenha a coragem de me enfrentar.
que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
que eu tenha a coragem de me enfrentar.
que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
como se estivesse plena de tudo”.
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