Considerado o filósofo
da amizade, o grego Epicuro de
Samos, afirmou em suas Sentenças
Principais que "De todas as coisas que a sabedoria nos oferece para a
felicidade da vida, a maior é a amizade". E tanto poetas quanto
filósofos destacam a importância de cultivarmos os amigos. Por isso preciso dar
o braço a torcer e parabenizar o fundador do facebook, Mark Zuckerberg, pela sua criação. Fato que
me proporcionou o entendimento de que a maioria das nossas amizades está ancorada
no rasante do rio que permeia nossa vida. Ou seja, nosso conhecimento em
relação aos “amigos”, sejam eles virtuais ou reais, é muito superficial.
Entretanto, com o advento da internet e, consequentemente do “face”, foi
possível conhecê-los um pouco melhor, através daquilo que publicam,
compartilham ou curtem. E vem daí o paradoxo ao qual me refiro, essa amizade
que muitas vezes cultivamos por anos, décadas, talvez, pode ter sido um
equívoco, baseada na ilusão que tínhamos valores semelhantes. Contudo, quando
percebemos a ambiguidade no modo de raciocinar do outro e de suas escolhas entram
as emblemáticas opções do facebook, nesse turbilhão de intenções: deixar de
segui-lo, bloqueá-lo ou excluí-lo, ou, ainda, ignorá-lo nessa simbólica rede de
relacionamentos, quase sempre supérfluos. Mas então qual o objetivo de manter
alguém tão distinto na sua galeria de “amigos”? Mostrar o quanto é sociável?
Talvez para muitas pessoas que não sejam adeptas à rede de relacionamento, isso
até seja possível, pois não há um envolvimento diário ou semanal. Até aí tudo
bem. Mas esse não é o meu caso. Anseio por notícias, quase que diárias, sobre
determinados assuntos: mundo animal, ufologia, política (agora nem tanto), ecologia,
novidades em utilidades domésticas, jardinagem, arquitetura e decoração, filosofia... e quase tudo encontro nas páginas que sigo através do facebook, o que facilita
minha atualização nesses assuntos. Porém, não há como ficar alheia a certas
postagens, que vem de encontro àquilo que faz parte da minha filosofia de vida
e das coisas pelas quais brigaria por acreditar profundamente. O problema está
justamente aí, essa teia de singularidades e contradições torna inviáveis alguns
relacionamentos, mesmo os ditos virtuais, pelo simples fato de que uma amizade
precisa de certos elementos para fazer sentido como: gostos semelhantes, senso
de humor em comum, espontaneidade, confiança, admiração e respeito mútuo. É
evidente que muitas vezes descobrimos pessoas encantadoras e muito mais
parecidas conosco do que podíamos sequer imaginar, e aquele amigo casual passa
a ser uma grata surpresa.

Entretanto, a decepção pode surgir de modo
recíproco, já que o outro tem suas peculiaridades tanto quanto você: sendo ele ateu, agnóstico, religioso fervoroso, ativista político, e ao perceber que você não
compactua com suas ideias ou ideais, tem a mesma sensação que a sua: a amizade
foi um ledo engano, e desatar esse relacionamento de fachada é o melhor a
fazer. Não estou aqui dizendo que devemos romper com aqueles que pensam
diferentemente de nós, mas tentando entender o porquê de algumas pessoas incluírem
estranhos aos seus “contatos” para logo após passar a travar com elas
verdadeiras batalhas on-line: carregadas de ofensas, indiretas e mágoas. Isso
não é um contrassenso? A prática da amizade não deveria ser um componente no
processo que possibilita lidarmos qualitativamente com os percalços diários, já que a vida tem suas penalidades?
É aqui que a “porca torce o rabo” como
diria minha avó, é inequívoco o fato de que precisamos conviver com opiniões
divergentes, mas quando essas extrapolam e distorcem seus conceitos que foram devidamente alicerçados
sob sua filosofia de vida, nada mais há a fazer. O ideal é que cada um siga seu
caminho sem a máxima de que quanto mais amigos melhor. Você pode gostar de
futebol, enquanto eu não. Eu sou uma “devoradora” de tudo que aborde o tema
ufologia, filosofia, antropologia. No entanto, entendo que ninguém precisa ser
adepto daquilo que instiga minha curiosidade, basta respeitá-la. E respeito
mútuo é a chave que faz essa ignição funcionar. Caso contrário é provável que a
amizade desande. Mas a questão é justamente essa: o degringolar é muito fácil
de ocorrer quando se percebe que o amigo virtual não é quem você pensava ser:
vocês não combinam sobre aspecto nenhum. São como a água e o vinho, o joio e o
trigo. Ele não gosta de animais e/ou de gente; faz piadas homofóbicas;
demonstra ser racista; egocêntrico, destila veneno em cada postagem; ostenta
ser o que não é: colocando-se num pedestal de superioridade; e ao final de tudo,
então, você percebe que não foi a máscara dele que caiu, mas o seu modo de
percebê-lo que se alterou. E isso me faz lembrar uma frase que seguidamente
circula pelo face: “Não foi outro que mudou, foi você que criou expectativas
demais em cima dele”. O que talvez você não esteja entendendo é onde eu
estou querendo chegar. Pois bem, eu tenho refletido muito sobre essa questão intrínseca,
pós facebook, que leva muitas pessoas a buscar de forma doentia uma
socialização forçada: basta um esbarrão com alguém, em qualquer lugar, para que
instantaneamente receba uma solicitação de amizade dessa criatura, cujo nome você
ainda nem assimilou direito. Isso não faz sentido! Você querer resgatar certas
pessoas, pelo passado incomum que tiveram, é até compreensível, mas transgredir
a ordem natural das coisas, através de um pedido, sem sentido, de amizade, é
algo impensável, até mesmo invasivo.
Em contrapartida tenho observado que os
relacionamentos reais, entre amigos, estão mais voláteis e desbotados. Assim o
afeto vai sendo conservado em barril de carvalho, num ambiente fechado e sem ventilação,
possibilitando sua evaporação. E as redes sociais, facebook, Instagram,
Snapchat, WhatsApp, Twitter e similares, de certa forma contribuem de forma
paulatina para que percamos o interesse social mais efetivo uns nos outros. E o
paradoxo está nessa forma, contemporânea, complicada de cultivarmos as
amizades. Dessa maneira os amigos virtuais criam uma sensação falsa de
intimidade e amizade, mesmo que ilusória, enquanto os amigos, de fato, construídos
sobre bases sólidas, longe dessas páginas de relacionamentos, vão se tornando
distantes, superficiais, quando os laços são abalados justamente por esse
contato informal. Em suma, a tecnologia que esta aí, e não deve ser desprezada,
veio, no caso das redes sociais, para nos mostrar o quanto há falhas em nosso
modo de comunicação. É essa fragilidade, portanto, que pode ser ou não interpretada
através dos emojis, símbolos que utilizamos de forma implícita para dizer
aquilo que queremos de forma pragmática. A sutileza nesse modo simbólico de conversação
sugere justamente a objetividade frequente com que passamos a tratar nossos
amigos, já que os signos representam uma linguagem universal, sem maior
comprometimento. Então ao perguntarmos se o outro está bem, ele nos envia uma confirmação
através do signo da “mãozinha positiva”. Logo, sem maiores comentários, e para o
nosso deleite, não foi preciso um envolvimento de fato, o que talvez pela falta
de tempo e de interesse efetivo, tenha nos deixado até mesmo aliviado. Todavia,
essa comunicação ciberespacial que passamos a estabelecer de forma pluralista com
os nossos amigos, passou a dissociar-se do ambiente físico, onde ele era presente,
para estender-se somente no espaço tecnológico, proporcionando uma ação à
distância e apática, inconstante e praticamente fantasmagórica. Diante disso é
provável que muito em breve venhamos descobrir que a melhor forma de interagir e
se inter-relacionar com os amigos seja através da velha e boa comunicação “primitiva”,
onde o diálogo era praticado olho a olho e a energia fluía de forma natural, ou
terminaremos isolados e solitários nesse mundo de relacionamentos descartáveis.